O movimento da Reforma Psiquiátrica Brasileira iniciado em meados dos anos 1970, ganhou força ao longo da década de 1980 em meio ao processo de redemocratização do país e da Reforma Sanitária que originou o Sistema Único de Saúde-SUS. A participação social de trabalhadores de saúde, usuários, familiares, pesquisadores, imprensa e outros atores sociais do campo da Saúde Mental/Políticas Públicas foi estratégica ao denunciar a violência dos hospitais psiquiátricos e a mercantilização do sofrimento psíquico pela “indústria da loucura” praticada pelo modelo asilar (DELGADO, 2011). A Lei nº 10.216/2001 (Brasil, 2001) é considerada o marco legal da reforma psiquiátrica brasileira por assegurar os direitos civis e humanos das pessoas em sofrimento mental, bem como garantir o cuidado comunitário. As normativas produzidas na década seguinte à publicação da Lei expressam os princípios da desinstitucionalização, objetivando transformações sociais na vida das pessoas egressas das instituições totais a partir da prática clínica e da vida em liberdade, inscrevendo-se, assim, na interface entre a teoria e a prática (Amarante, 2001).
O Programa de Volta para Casa (PVC), regulamentado pela Lei nº 10.708/2003, é um benefício monetário, considerado um auxílio para a reabilitação psicossocial “para assistência, acompanhamento e integração social, fora de unidade hospitalar” (Brasil, 2003). Esta estratégia se baseia em recomendações da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e Organização Mundial da Saúde (OMS) para o campo da Saúde Mental, visando substituir o modelo centrado em hospitais especializados por uma atenção realizada em serviços territoriais de base comunitária. Atualmente, o programa tem abrangência municipal e possui mais de 4 mil beneficiários ativos. Destaca-se como uma política pública inovadora que favorece a autonomia, à contratualidade social e o exercício da cidadania dos ex-pacientes.
Nesse sentido, a escolha do PVC para esta edição temática é justificada por sua importância no contexto da reforma psiquiátrica brasileira, seu caráter intersetorial e pelo reconhecimento da OPAS/OMS de sua relevância para o processo de desinstitucionalização de pessoas com histórico de longas internações psiquiátricas e à potencialidade como dispositivo de apoio para reinserção na vida comunitária. Ademais, constata-se uma lacuna de publicações científicas indexadas que abordem as experiências acumuladas ao longo dos dezesseis anos de vigência do programa e seus resultados pelo território brasileiro.
Dessa forma, ambiciona-se compilar reflexões científicas reveladoras da multiplicidade das experiências locais, adensar o quadro crítico sobre os paradigmas de sua constituição, limites e possibilidades e análises avaliativas sobre a potência do programa como recurso estratégico do cuidado em liberdade.
TÓPICOS IMPORTANTES PARA SEREM TRATADOS NO NÚMERO TEMÁTICO:
- Teórico-conceituais: o programa no contexto da reforma psiquiátrica,
- Experiências no campo da gestão: implementação e execução do programa nos municípios, articulação com as Redes de Atenção
- Experiências no campo do cuidado: as transformações na vida dos beneficiários, sua função para a reabilitação psicossocial
- Saberes e Práticas constituídos: inovações no campo das políticas públicas intersetoriais
- Experiências de reorganização de espaços das cidades e seus possíveis resultados;
- Os rótulos/estereótipos que as cidades receberam e como lidam com as suas “marcas”;
- Experiências locais de reabilitação psicossocial nos mesmos moldes do PVC;
- Que os textos a serem apresentados sejam, preferencialmente, fruto de pesquisas.
ESTA CHAMADA PÚBLICA ESTARÁ ABERTA DO DIA 01/03/2020 até dia 30/06/2020. OS ARTIGOS DEVERÃO SER ENVIADOS PARA O E-MAIL: nucleoatencaopsisocial@gmail.com
ORGANIZADORES: Ana Paula Guljor, André Vinicius Pires Guerrero, Barbara Coelho Vaz, June Correa Borges Scafuto, Karine Dutra Ferreira da Cruz, Fernanda Maria Duarte Severo, Rosana Onocko Campos, Silvio Yasui.